2.9.09

ABELARDO o filósofo poeta

Pedro foi o seu nome de baptismo a que mais tarde acrescentou o de Abelardo , de habelardus que quer dizer abelha, em homenagem ao historiador grego Xenofonte a quem chamavam de abelha ática. O jovem Pedro nasceu, em 1079, na localidade de Le Pallet, próximo de Nantes , na Bretanha. Por ser filho primogénito de um cavaleiro ao serviço do duque da Bretanha , aprendeu artes militares pois estava destinado a vir a ser o senhor da sua aldeia . A sua vida, no entanto, tomou um rumo diferente pois, naquela época , a Europa vivia em paz e em desenvolvimento económico e demográfico. A prosperidade material e o renascimento cultural que se viviam no final do século XI, levaram o jovem Pedro a descobrir que os livros o atraíam mais que as armas e a política , tendo-se dedicado a estudar filosofia. Aos dezassete anos muda-se para Loches, na França central, onde Roscelino Compiégne ensinava filosofia . Em breve enfrentava dialécticamente este mestre, derrotando-o em debate , ao rebater as teorias nominalistas sobre a Trindade. Dois anos mais tarde (1098) vai para Paris onde assiste às aulas de Guilherme Champeaux, afamado filósofo e dialéctico. Também aqui o jovem Pedro enfrenta o mestre Guilherme e leva este a admitir que o seu discípulo lhe é muito superior em argumentação . Em 1102 completa o trivium que era o estudo da gramática , retórica e dialéctica , ficando assim habilitado a ensinar em colégios menores Entretanto volta a Le Pallet por motivos de doença e aí continua a ler os clássicos gregos e latinos. Seis anos depois volta a Paris para estudar aritmética, astronomia , geometria e música que constituíam o quadrivium. Obtém assim o grau de mestre que lhe permite ensinar na universidade de Paris, o que vem a acontecer em 1114, com imensos alunos estrangeiros a assistir ás suas aulas e onde chegou a ser reitor. Tudo muda por volta de 1115. Naquele tempo os homens casados não podiam ser professores pois se dizia que o casamento retirava tempo ao estudo e à reflexão. Abelardo, com 35 anos ,continuava solteiro mas conhecera uma jovem de 15 anos , Heloísa, sobrinha de Fulbert o poderoso cónego de Paris . Como as mulheres não podiam frequentar as escolas e a jovem tinha rara inteligência, Abelardo prontificou-se a dar-lhe aulas particulares em casa do tio , onde foi convidado a hospedar-se. Desta aproximação veio um louco amor que viria a ser fatal. Quando Heloísa apareceu grávida de Abelardo ,o tio Fulbert ficou fulo pois tinha consentido nas aulas mas estando a pupila acompanhada de uma criada. Heloísa foge para casa da irmã de Abelardo, em Le Pallet, onde dá à luz um filho a que deram o nome de Astrolábio. Para não prejudicar a carreira académica de Abelardo, e Heloísa deixar de ser mãe solteira, o tio Fulbert faz-lhes um casamento secreto em Notre Dame. Fulbert que aceitara este estratagema , desconfiou contudo de uma posterior proposta de Abelardo para que Heloísa se refugiasse num convento, pensando que seria esta ideia uma maneira de Abelardo repudiar a sobrinha. Resolve então vingar-se pagando a sicários para castrar Abelardo, o que veio a acontecer. Pelas leis da época um castrado já não podia dar aulas e , por tal motivo, Abelardo deixa o ensino na universidade de Paris e refugia-se na escola-mosteiro de St.Denis , acabando por aí morrer em 1121.Durante muitos anos o casal viu-se algumas vezes mas sem se falar. Cada um em seu convento , trocavam cartas amorosas das quais transcrevemos duas , as mais conhecidas:
Abelardo para Heloísa Fujo para longe de ti , evitando-te como a um inimigo, mas incessantemente te procuro em meu pensamento. Trago tua imagem em minha memória e assim me traio e contradigo,eu te odeio, eu te amo. De Heloisa para Abelardo : É certo que quanto maior é a causa da dor , maior se faz a necessidade de para ela encontrar consolo, e este ninguém me pode dar, além de ti . Tu és a causa da minha pena e só tu me podes proporcionar conforto. Só tu tens o poder de me entristecer,de me fazer feliz ou trazer consolo. Quando Abelardo faleceu Heloísa, então superiora do convento de Argentauil, mandou erigir um mausoléu de estilo gótico para o marido, deixando ordens escritas de que quando ela falecesse fosse enterrada junto dele . È desse monumento que apresentamos as fotos seguintes:

No aspecto filosófico destacamos de Abelardo o seguinte : reformulou o conceitualismo, posição intermédia entre o idealismo e o materialismo. O idealismo nega a realidade individual das coisas distintas do "eu " e só delas admite a ideia , enquanto o materialismo reduz tudo , incluindo a alma, à unidade da matéria . O Conceitualismo defende que o universal existe nas próprias coisas e que, separado delas, não é uma realidade em si própria como queriam os realistas , nem uma simples palavra como queriam os nominalistas , mas um conceito do espírito. As obras de Abelardo abrangiam três áreas:lógica, teologia e ética . No seu primeiro e mais famoso livro SIC ET NON já demontrava uma personalidade polémica pois as questões filosóficas e teológicas nele contidas levaram a diversos pontos de vista entre os académicos. O seu escrito mais polémico intitulava-se Dialéctica , mas teve outros como : Glosas literais, Lógica nostrorum, Logica ingredientibus , Theologia summi boni , além de uma autobiografia Historia calamitatum ou História das minhas desventuras onde conta os amores e as desgraças do seu casamento com Heloísa. Nas cartas que escreve á sua amada surge o Abelardo professor e o Abelardo homem, carregado de dúvidas e de paixões, estimulado por um desejo de busca que põe a razão ( a dialética ) como instrumento chave da formação humana.Esta história de amor de Heloísa e Abelardo foi recriada, séculos mais tarde, com "Romeu e Julieta" para já não falar de Pedro e Inês no nosso país, cujo amor é recordado em Coimbra na velha Quinta das Lágrimas e na moderníssima e bela ponte pedonal sobre o Mondego.

1 comentário:

Anónimo disse...

Que linda história de amor, nos acabou de contar !
Que raios de costumes aqueles da época, em que os professores não podiam casar !
Parabéns por mais este delicioso e histórico documento.

Mário

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